Coordenação do Nossa Itaquera na Reunião do Plano de Metas da Zona Leste

Coordenação do Nossa Itaquera na Reunião do Plano de Metas da Zona Leste
Ativistas do Nossa Itaquera

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

A ALUNA "B" DO COLÉGIO BANDEIRANTES E AS LIÇÕES DO DIA DOS ESTUDANTES



A ALUNA “B” DO COLÉGIO BANDEIRANTES E AS LIÇÕES DO DIA DOS ESTUDANTES

Neste 11 de agosto, último sábado, também comemorou-se o Dia dos Estudantes. E como costumo fazer nesta data, refleti sobre esta coisa de ser professor. O trabalho na sala de aula. As escolas. Os alunos. E entre os pensamentos surgidos, me veio  a memória da amizade construída, com uma estudante, numa viagem. Uma viagem que ocorreu faz mais de vinte anos, de ônibus, pelas estradas e rios do Pantanal. Voltei ao Pantanal, passado este tempo todo, nas últimas férias, ou recesso escolar, em julho deste ano.  Ou seja, no mês passado retornei ao Pantanal, mas estava com meu filho pequeno e fomos de avião. A viagem agora foi rápida. E chegando ao destino, a beleza da paisagem tomou toda nossa atenção. No passeio feito, na primeira vez, de ônibus, por semanas, até e pelo Pantanal,  o tempo do percurso favoreceu a construção de amizades. E esta amizade surgida com a estudante naquele passeio me trouxe novos conhecimentos. Na época, não tinha ainda trinta anos. Tinha concluído o Curso de História e já tinha intensa militância no Partido Comunista Brasileiro e em várias organizações comunitárias e sindicais. Era, na verdade ainda sou, um comunista ortodoxo. E minha jovem amiga, de viagem, era uma estudante secundarista. Devia ter quinze anos.  E era aluna do Colégio  Bandeirantes, de São Paulo. Para quem não conhece, o Colégio Bandeirantes é um dos que atendem a elite paulistana. E seus gestores, professores e alunos sabem bem disto: são da elite e os alunos desta  escola são preparados conscientemente para permanecer na elite, econômica, social e cultural. Seus alunos sabem que são  preparados para governar. Governar as empresas, sua cidade e o País.

E esta jovem amiga falou,  bastante,  sobre esta característica do Colégio Bandeirantes.  E sobre o impacto desta disposição seletiva junto ao grupo de alunos. Naturalmente, o resultado deste projeto educacional só pode ser a extrema competitividade entre os alunos. E foi sobre este espírito que a estudante preferiu comentar. Sobre os efeitos deste clima de disputa que colocava os alunos em categorias. Havia o grupo dos alunos “A”, que era o dos alunos excelentes. A nata. Abaixo deles, os “quase excelentes”, do grupo “B”, e assim por diante. A minha amiga pertencia ao grupo “B”. Não tinha ilusão de poder ascender ao grupo “A”, mas não deixava de dormir por conta disto. Era muito tranquila, autoconfiante e muito, muito, preparada para o trato dos temas mais diversos. Com seus quinze anos falava de quase tudo com conhecimento e argumentos consistentes: política, economia, questões sociais, ambientais, culturais. Até sobre futebol.  Na época eu achava o futebol alienante. Uma bobagem, a minha, e de parte da esquerda daquele período. E a menina me deu uma grande lição sobre a importância do futebol para o mundo e para a cultura brasileira. Falou do futebol como paixão. Foi convincente.

Falamos também, bastante, sobre política, filosofia, ética, estes assuntos.  E era uma conversa animada  pela própria diferença dos interlocutores. Eu era um professor de história, comunista, que lecionava em várias escolas do extremo da Zona Leste; e ela era uma estudante, com metade da minha idade, de uma das escolas particulares mais elitista de São Paulo. E esta conversa, no tema da ética, foi ainda alimentada por um episódio ocorrido na viagem de volta. Do Pantanal, em Mato Grosso, tínhamos atravessado a fronteira duas vezes. Uma  rápida entrada na Bolívia e uma outra no Paraguai. No retorno, a passagem pelo Paraguai não ficou impune. O ônibus foi parado na estrada pela Polícia Rodoviária. Iriam revistar as bagagens e a reação dos viajantes foi rápida. Fizeram logo uma caixinha para subornar os guardas. Quando o passageiro coletor da propina passou pelo nosso banco eu, pragmaticamente, não hesitei em contribuir com o grupo. Não tinha motivos pessoais para preocupação com a revista das bagagens.  O único bem que tinha adquirido  na visita à Bolívia foi um estiloso chapéu que fez algum sucesso nas brincadeiras da viagem. Tanto sucesso que foi logo roubado numa das festas em que fomos após o retorno. Mesmo assim, colaborei com a propina. E isto deixou minha amiga estudante do Colégio Bandeirantes completamente indignada. A menina cobrou satisfações. Como eu, um professor de história, comunista, cedia tão facilmente à pressão dos demais passageiros corruptores!  A menina me encurralou. Tive dificuldade em responder. Na verdade nem me dava ao trabalho de pensar seriamente no  assunto. Com certo pragmatismo bolchevique alheio às contradições internas e miúdas do capitalismo, achava que a corrupção policial era perfeitamente compatível e coerente com o próprio sistema capitalista. Um mal inerente ao sistema. Sistema que eu combatia em outra escala. Não perderia tempo discutindo a ética  pequeno burguesa de um sistema intrinsicamente perverso. Mas a garota não ficou convencida. Sua indignação era total e fundamentada. Seus argumentos eram racionais mas carregados de emoção. A menina trazia aquilo que Darci Ribeiro chamava de “fibra ética” da juventude. Hoje, passados mais de vinte anos, continuo  com meu bolchevismo voltado aos grandes combates, mas busco também prestar mais atenção às coisas “pequenas’ mas importantes do cotidiano. Deste curto convívio, aproveitei o conhecimento obtido para estimular meus alunos do Ensino Médio, e mesmo do Ensino Fundamental, para que pensassem sobre quais seriam seus objetivos com a Educação. Aquelas conversas, portanto, renderam bastante. E neste dia 11 de Agosto passado, Dia dos Estudantes, gostaria muito de saber para quais caminhos a vida teria levado toda aquela vitalidade estudantil da aluna “B” do Colégio Bandeirantes.
Valter de Almeida Costa


Nenhum comentário:

Postar um comentário