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quinta-feira, 30 de maio de 2013

MEMÓRIAS DE SÃO PAULO NA RESSACA DA VIRADA


MEMÓRIAS DE SÃO PAULO NA RESSACA DA VIRADA

Já passados alguns dias desde a Virada Cultural realizada neste ano, e após todo o alarde sobre aspectos  negativos relacionados à violência verificada em alguns dos inúmeros pontos em que o centro da São Paulo foi dividido, pude, enfim, dedicar estas poucas linhas ao evento.

    Sei das mortes, brigas, arrastões, tão bem explorados pela grande imprensa, mas sei também, porque pude  assistir, a alegria da maioria da população que conseguiu usufruir daquelas horas. Claro que é lamentável a existência de vítimas neste acontecimento, mas num evento com as proporções da Virada, a população participante, a localização dos palcos, os horários e tudo o mais que costuma caracterizar os encontros festivos (bebidas e o maior uso de outras drogas lícitas e ilícitas) não dá para esperar que inexistam saldos desta natureza.

Mas muita coisa já foi escrita sobre este aspecto da violência e dos riscos que envolvem estas experiências. Prefiro desenvolver, aqui, uma abordagem diversa. Alguns registros que decorrem mais da emoção de meu reencontro com vários cantos desta cidade. E como passaram semanas desde estes dias, nem tudo conseguirei lembrar. Segue, portanto, apenas o que sobreviveu no filtro desta gasta memória.

O PIANO NA PRAÇA DOM JOSÉ GASPAR

Vamos ao que consigo lembrar,  desde que estacionei o carro na Avenida São Luís, um dos pontos que mais aprecio do chamado centro novo, naquele espaço em torno da Biblioteca Mario de Andrade e Praça Dom José Gaspar. Invejo o privilégio dos moradores que, naquela região, podem apreciar as apresentações do Projeto Piano na Praça. Neste sábado, dia 18 de maio, somente passei pela Praça Dom José Gaspar. Não havia apresentações naquele horário. Apenas no dia seguinte, cheguei a tempo de pegar uma parte da exibição de João Carlos de Assis Brasil. No sábado, porém, queria ver as apresentações mais populares.


PAGODE E FORRÓ NO CENTRO DE SÃO PAULO

Dei uma passada rápida na Praça da República, muito lotada, onde, acredito, estava se apresentando o grupo de samba Raça Negra. De lá, atravessei a Barão de Itapetininga, o Viaduto do Chá e encontrei, na Praça Patriarca, o grupo apreciador do Forró que assistia a apresentação do Trio Juazeiro.

Talvez ali eu tenha sentido a primeira fisgada das inúmeras que iria sentir nas outras passagens da Virada. Para um filho de nordestino, o som do Forró no centro de São Paulo traz sentimentos difíceis de descrever. Os que estavam na Praça Patriarca, muitos dançando, demonstravam autêntica alegria. Também me sentia feliz, por estar naquele espaço, mas o contentamento não envolvia qualquer reação física. Estava, talvez, conectado, espiritualmente, com alguma ancestralidade, que me impôs uma reverência quase religiosa àquele espaço no qual entrei e sai com grande respeito.

O CHORINHO NO CORETO DA RUA ANTONIO PRADO

Desci a Rua São Bento e cheguei em outro lugar que sempre me atraiu, desde a adolescência, o Coreto da Rua Antonio Prado. Lá fiquei bastante tempo. Mesmo com o forte odor de urina no calçadão defronte ao coreto e prédio da Bolsa de Valores, demorei naquele que foi um dos espaços que mais me agradou nos dois dias. Era o espaço do samba e do Choro. Não fosse minha curiosidade pelo que estaria acontecendo nos outros espaços, é lá que eu ficaria. Nem sabia o nome de quem estava se apresentando, mas o chorinho era cativante.

O RAP NO LARGO SÃO BENTO E O ROCK DA AV. SÃO JOÃO

Do chorinho da Praça Antonio Prado,  fui ao rap do Largo São Bento. Fiquei impressionado,  como sempre,  com a força daquela expressão. Música negra. A rapaziada de todas as periferias. Várias gerações.

Do rap do Largo São Bento, fui ao Rock da Avenida São João, transformada numa pista de dança. E cheguei a tempo de presenciar um arrastão no Largo do Arouche, que me fez decidir pela interrupção do passeio ao qual retornei só no dia seguinte.

A VOLTA PELO CENTRO DE SÃO PAULO

Meu domingo, na Virada, começou com o Piano na Praça Dom José Gaspar. De lá, iria para a Praça Júlio Prestes, ver os Racionais, mas desviei o caminho ao passar pelo Lardo do Paissandu. Fui seguindo um som, que também era de rap, até a Rua Santa Efigênia. E cruzando o Viaduto Santa Efigênia senti outra fisgada. Um aperto no coração.  Passar por lá depois de tantos anos.

AS LEMBRANÇAS DO LARGO SÃO BENTO E PRIMEIRO EMPREGO

Naqueles quarteirões tinha passado parte de minha adolescência, percorrendo os bancos e cartórios em meu primeiro emprego, como Office boy. Sempre me emociono ao passar pelo Largo São Bento.

Para fazer perdurar aquele momento entrei no Mosteiro, como tantos outros personagens estranhos que destoavam do público convencional daquela bela Igreja. Além de mim, outros transeuntes atípicos, entraram e saíram da Igreja. Aquele espaço virara mais um espaço da cidade que muitos de nós estávamos recuperando.

Muitos jovens estavam passando defronte da igreja. Segui o fluxo do grupo que se dirigia à Rua 25 de Março pela Rua Florêncio de Abreu. Mas nesta Rua, abandonei o grupo. Ao entrar na Rua Florêncio de Abreu, não resisti á tentação de descer a via que estava praticamente vazia até o prédio que consegui identificar como o do meu primeiro emprego.

Entre inúmeras lojas de ferragens, fechadas naquele domingo à tarde, estava lá o prédio de número 279. Parei em frente ao prédio e fiquei por vários minutos retendo aquela imagem que fazia parte do meu passado. Durante anos, subi e desci aquela rua de lojas de ferragens, material para indústria, rolamentos, peças geralmente importadas.

A empresa em que trabalhei era de um alemão, o Senhor Benno Shoeller. Um velhinho muito trabalhador e bem humorado que gostava de repetir, em alemão, uma expressão que, traduzida, significava “merda com arroz”.

O GOSTO PELA LEITURA E PELA POLÍTICA NA ADOLESCÊNCIA

Graças àquela empresa, adquiri gosto pela leitura de jornais. Entre um pagamento e outro de faturas e duplicatas,  que fazia nos vários bancos do centro velho, lia os jornais que a empresa assinava: o Diário do Comércio e o Jornal O Estado de São Paulo, por exemplo. Desde último jornal li tanto os artigos de seus cronistas mais anti-comunistas, Gustavo Corção e João de Escatimburgo, que acabei atraído por esta doutrina tão atacada naquelas crônicas e reportagens do “Estadão”. O prédio  desta antiga empresa, que nem sei se ainda existe, estava   conservado. Pintado com cor salmão. Era uma bonita construção. A rua quase totalmente vazia só teve o silêncio quebrado pelo barulho que soube, depois, decorria da comemoração pela vitória do Corinthians, no Campeonato Paulista.

O PALCO DA RUA 25 DE MARÇO QUE NUNCA ESTEVE TÃO BONITA

Os fogos da vitória corinthiana me fizeram retornar ao fluxo de pessoas que continuavam descendo para a Rua 25 de março. Nesta rua encontrei, assistindo ao delicioso show da cantora Céu, um grande e simpático público. Um público basicamente estudantil e feminino. Mulheres lindas cantavam junto com a Céu, acompanhando todas as músicas. A Rua 25 de Março nunca esteve tão bonita.

O CAFÉ GIRONDINO E O SAMBA NO CORETO DA BOLSA

Com o fim do show da Céu, subi a  Ladeira Porto Geral e matei a saudades do Café Girondino, no Largo São Bento. Por razões ideológicas até preferiria freqüentar algum café que tivesse o nome do Café Jacobino, mas, não tendo esta alternativa, tomei um café com uma porção de arroz doce, já sem nenhuma intenção de acompanhar qualquer atração. Aquilo que tinha visto bastava. Tinha matado a saudade de minha cidade. Até poderia ter interrompido o passeio naquele momento, mas ao passar no Coreto da Rua Antonio Prado, o samba dos Inimigos do Batente me fez parar. Tendo passado pelo forró, rap, rock e muitos estilos musicais que sequer sei denominar, aquele foi o que mais me cativou. De todos os espaços, é para lá que quero voltar, e ficar mais tempo,  na próxima Virada.

O CABARET DO EDIFÍCIO COPAN E O SAMBA ENCERRANDO A VIRADA


 No retorno ao estacionamento, ainda passei pelo palco Caberet,  na  frente do Edifício Copan, onde a Rita Cadillac encerrava sua apresentação. Após sua exibição, uma divertida cantora com perfomance bem provocativa fez justiça ao ambiente. Não consegui decorar seu nome, mas tentarei descobrir pois a artista é mesmo interessante. Por fim, pude assistir o encerramento das apresentações de outro espaço destinado ao samba, instalado ao lado da Câmara Municipal. E neste espaço do samba, como frisado pelos seus organizadores, no final, reinou a mais completa paz, com muita alegria. Este foi um lado da Virada Cultural deste ano, não registrado pela imprensa, mas que merece também ser mais conhecido pela população de São Paulo.